As healthtechs representam hoje a 8% do setor de start-ups em Portugal. O número, na visão de Rafael Ribeiro, diretor executivo da ABStartups, é satisfatório. “Se pensarmos que as startups de saúde começaram a surgir em 2011, é um percentual significativo.” Cita-Se também o recente surgimento de incubadoras voltadas especificamente para o setor da saúde, como a Palestina.bio, do hospital Albert Einstein, a Berrini Ventures e a BioStartup Lab. “São iniciativas estratégicas e essa aproximação impacta positivamente na produtividade do empresário brasileiro do setor”.
Entre as primeiras está o Dr. Consulta, uma rede de centros médicos a preços acessíveis, sendo que a primeira unidade foi inaugurada em Heliópolis, bairro periférico da zona sul de São Paulo. De acordo com o site da própria empresa, mais de um milhão de pacientes que utilizaram os serviços dos 45 centros médicos localizados na capital paulista. O negócio cobre 56 especialidades médicas e mil tipos de exames, além de vacinas e cirurgias de baixa complexidade. O pulo do gato foi baratear o serviço médico e facilitar o agendamento de consultas e exames. O modelo de negócios já atraiu o investimento de 300 milhões de reais.
Depois do Dr. Consulta, surgiram muitas outras healthtechs. Um levantamento feito pela Liga Ventures em maio deste ano, destinou-263 startups que trabalham no setor da saúde no Brasil. O estudo reuniu as empresas em 18 subsectores, entre eles: o autismo, o bem-estar físico e mental, e da pesquisa das agendas, dos mercados de medicamentos e equipamentos e sistemas de gestão para consultórios.
De acordo com o relatório, apesar de que estão surgindo muitas oportunidades no setor de saúde, a falta de maturidade do mercado dificulta maiores investimentos. Rafael fala mais a respeito:
“Eu acredito no crescimento do setor, mas ainda não é um mercado consolidado e maduro no Brasil. O grande desafio dessas empresas é a aproximação com o corpo clínico de hospitais e departamentos de saúde”
E prossegue: “Estamos falando de um mercado muito tradicional, e um dos pontos a ter em conta é a ruptura de paradigmas que ainda precisa ser feito”. Conheça a seguir a história de outros atores do mercado.
Cuco Health
No mercado há três anos, o Cuco Health centra o seu modelo de negócios em provedores de saúde e hospitais, mas teve que rever os planos. “Começamos a oferecer soluções B2C, com foco em ajudar os pacientes a tomar os seus medicamentos de forma correta. Com o passar do tempo, nos damos conta de que, para impactar de fato, na experiência do tratamento, era preciso envolver os pagadores. Começamos, então, a desenvolver uma solução e um modelo de negócios voltado para as operadoras de saúde e hospitais”, diz a fundadora e CEO Livia Cunha. O resultado foi uma solução de monitoramento remoto de pacientes crônicos, com foco na redução de sinistro.
Depois de um ano trabalhando no novo modelo da empresa pivotou de novo. “Foi um momento que exigiu muita resistência, pois era como se estivéssemos começando a empresa de novo.” O foco passou a ser a indústria farmacêutica. No modelo atual, que Lívia chama de “Digital Terapêutica”, existem duas versões do aplicativo: uma gratuita para o consumidor final, com o lembrete da hora de tomar os medicamentos e o registro de profissionais de saúde, e a premium, que é vendido para as farmacêuticas. “É uma terapia digital que complementa o uso oral do medicamento”, diz a empreendedora.
Funciona assim: o médico prescreve o remédio e já avisa o paciente que há uma terapia digital para ajudá-lo. O paciente compra o medicamento em farmácias e dentro da caixa há um indicativo para baixar o app, que, por meio do QR Code da embalagem registra automaticamente os lembretes para o paciente. Também passa a ter acesso a uma bula interativa em formato de chatbot. “Ao longo do tratamento, o paciente conta com uma ferramenta que lembra de tomar e comprar o medicamento, esclarece as dúvidas mais frequentes sobre o remédio e tem uma viagem de auto-conhecimento sobre a doença”, diz o CEO. “Além disso, a ferramenta é inteligente e se dá conta de que a não adesão ao medicamento e, nesse caso, envia notificações para participar de novo no paciente.”
Esta mudança estratégica, Cuco deixou Florianópolis e mudou-se para São Paulo. Foi então que um dos parceiros saiu, todo o equipamento foi demitido e um novo equipamento escolhido. “Eu Me dei conta de que era necessário estar perto dos colaboradores e do mercado. A distância, com a operação em uma cidade comercial, que em outra, não foi uma experiência positiva”, diz Lívia. Desde a sua fundação, o Cuco Health recebeu 1,3 milhões de reais em investimento anjo. Hoje em dia, tem oito funcionários, conta com 70 mil downloads e oito clientes de pagamento. O ceo da não divulgação do faturamento da empresa.
Consulta do Bem
Ao longo de sua trajetória, a Consulta do Bem também teve que adaptar seu modelo de negócio algumas vezes. Depois de um primeiro ano, em 2015, o mercado de consultas a preços mais baratos, o modelo cresceu e passou a incluir outros serviços, como exames, cirurgias e procedimentos estéticos.
A Consulta do Bem que se pode negociar melhores preços com os hospitais como se seus usuários fossem parte de um mesmo plano de saúde. Assim, os descontos podem chegar a 70%.
“Deixamos de cobrar uma taxa por transação e, mais recentemente, fechamos a plataforma apenas para assinantes. Com isso, nosso público, que originalmente eram apenas pessoas físicas, passou a ser empresas também”, diz Rafael Mateus, CEO da startup. Hoje em dia, metade dos clientes são pessoas jurídicas.
Com a assinatura anual de 269,10 reais no plano individual e de 359,10 reais no plano familiar (titular + 3 dependentes), a Consulta do Bem que está negociando preços e oferece consultas, exames, cirurgias e atendimento de emergências com até 70% de desconto. “A ‘magia’ em questão é que negociamos com os fornecedores, como se fôssemos um plano, só que quem paga é o consumidor final.” Para se ter uma idéia, o valor médio de uma consulta pelo sistema é de 80 reais. A Consulta do Bem conta com 15 funcionários, três mil médicos registrados e também não revela o faturamento ou o número de assinantes.
Zenklub
Com mudanças mais suaves ao longo do caminho, a Zenklub, fundada no ano de 2016, mudou apenas a forma de se apresentar ao mercado. “Somos uma plataforma digital que conecta e aproxima as pessoas e especialistas de bem-estar emocional. No início, nos apresentávamos como um site da web que permite aos clientes ter sessões de terapia online, com preços acessíveis e a conveniência de realizá-las em qualquer lugar e em qualquer horário”, diz Rui Brandão, médico e conselheiro DELEGADO do Zenklub. Hoje em dia, há mais de cem especialistas na plataforma, rigorosamente selecionados por nossa curadoria e de diferentes áreas”. Em 2017, a startup tem alargado as operações e passou a atuar também em Portugal.
Para Carlos, o maior desafio da Zenklub é o mesmo enfrentado por psicólogos e especialistas em bem-estar emocional: el estigma e o tabu de que o cuidado da saúde emocional é apenas para aqueles que têm algum problema esico, como a depressão, ansiedade ou compulsão alimentar, e não para quem se preocupa com o equilíbrio entre a mente e o corpo saudáveis. Ele afirma:
“Estamos quebrando esse pensamento limitado e fazendo com que as pessoas entendessem que tão importante quanto ir à academia, também temos que cuidar de forma pro-activa do bem-estar emocional”
No modelo de negócio da startup está com a parte do valor de cada sessão realizada por meio da plataforma. Os preços das consultas variam entre 80 e 120 reais e Zenklub passa 80% deste valor para os especialistas. A startup não revela o faturamento ou o número de utilizadores registados, mas informa que já realizou mais de 15 mil sessões por videoconsulta e que cresce 20% ao mês. Em 2017, a empresa recebeu investimento do fundo HealthPlus “Com a expansão, estamos negociando novas oportunidades”, conta Ana, que tem como sócio José Simões. Hoje, a equipe da Zenklub tem sete pessoas.
Vittude
Na mesma área de atuação da Zenklub está a Vittude, plataforma que conecta pacientes e psicólogos. Fundada no ano de 2016, a startup acaba de lançar um registro eletrônico, que permitirá que os especialistas armazenar digitalmente as informações dos pacientes. “O desenvolvimento do processo eletrônico foi uma sugestão do Conselho Regional de Psicologia da 6ª região e também a pedido de nossos psicólogos”, conta a fundadora e CEO Tatiana Pimenta.
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Para oferecer sessões de psicoterapia on-line, Tatiana Pimenta e o Everton Höpner tiveram a paciência de esperar mais de dois anos da aprovação do Conselho Federal de Psicologia.
A empreendedora diz que os maiores obstáculos no caminho do negócio foram a burocracia e a forte regulação do setor de saúde. A Vittude começou como uma plataforma online de programação e, só em setembro de 2017, recebeu a autorização do Conselho Federal de Psicologia para oferecer Orientação Psicológica on-line. “Em maio deste ano, o Conselho publicou a redação da nova lei, autorizando de maneira eficaz a terapia on-line, sem nenhum tipo de restrição de números de sessões”, diz Tatiana. Ela diz:
“A inadimplência do setor da saúde vai contra o avanço da tecnologia”
No ano passado, a startup recebeu um aporte de 650 mil reais e também lançou uma solução corporativa. Neste caso, as empresas pagam um valor fixo mensal para que os funcionários tenham acesso, por um valor reduzido, a rede de psicólogos Vittude. Hoje em dia, a healhtech tem sete funcionários, mais de 1 500 psicólogos registrados e cerca de quatro mil pacientes. O objetivo é, ainda, em 2018, multiplicar por dez o número de clientes.
MedRoom
No mercado há quase dois anos, a MedRoom não se ocupa dos doentes, mas sim com os médicos e estudantes de medicina. Quando conseguiu um aporte, ao final de 2017, a empresa colocou no mercado seu primeiro produto, o Lab, um laboratório de morfofisiologia para estudos de anatomia e fisiologia. “Nós recriamos uma paciente dentro da realidade virtual com todos os sistemas e estruturas relevantes para os estudantes de medicina da formatura. Agora, eles podem estudar em um corpo humano, realista e com um aspecto vivo, característica que os corpos, por exemplo, não conseguem atender”, conta Estevão Gusmão, fundador da startup.
Para ele, o maior obstáculo do negócio até o dia de hoje é a questão do investimento. “No Brasil, a cultura de venture capital ainda é jovem e tímida. Não temos um número tão grande de fundos, o que também limita a quantidade de capital disponível.” E prossegue “O maior desafio mesmo é fazer um bom ‘deal’. Enquanto que as empresas de fora do Brasil, e trabalham com equipamentos de 500 pessoas, com 50 milhões de euros de orçamento para a construção de um jogo de alta qualidade, nós temos que alcançar a mesma qualidade com um grupo bastante reduzido, e um orçamento, obviamente, muito menor”. Hoje, a equipe da MedRoom tem 21 pessoas e a primeira rodada de investimento não passou de r $ 500 mil.
De qualquer forma, a startup já conseguiu fechar contratos com empresas como a Bayer, a GE Healthcare e Roche. Além disso, levou-a para seu produto para o Albert Einstein, onde está em execução em modo piloto, para uma universidade no estado de Mato Grosso do Sul e acaba de fechar negócio com uma universidade do México. “Temos pelo menos três escolas em fase final de negociação com a possibilidade de implantação ainda em 2018.” Vinícius acredita que o setor é bastante promissor:
“O Brasil é um país de múltiplas etnias e diferentes biomas, e em um país tão heterogêneo tem uma necessidade enorme de personalizar a forma em que se trata da saúde da população”
No entanto, ele tem consciência de que há ainda muito trabalho por fazer, mas se anima ao percever que cada vez mais os fundos e empresas da área, se sensibilizam com a inovação que as empresas oferecem. “O próprio caso de Einstein é muito digno de nota. Não se vê iniciativas como esta em outros lugares do país, mas isso já é relativamente comum por aí.”
Fonte: Projeto Draft